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Deserto de Alamogordo, Novo México, Estados Unidos. Uma cidadezinha de 30 mil habitantes e acontecimentos, no mínimo, estranhos. Mas você nem imagina qual o maior deles.

Foi perto dela que aconteceu o primeiro teste de bomba nuclear do mundo; ali perto, também, está o túmulo de Ham, o primeiro chipanzé e também o primeiro americano a ir ao espaço, lá também foi batido um recorde de velocidade, porém isso não é o que mais atrai curiosos à cidadezinha.
Milhares de turistas vão à cidade todo ano atrás do seu lixão, exatamente, seu aterro sanitário. Mas o que montes e montes de lixo e entulho poderiam ter de tão importante? Reza a lenda que lá está enterrado, literalmente, o pior jogo de videogame de todos os tempos: E.T. de Atari.
Como você pode ver no vídeo acima, sua missão é coletar o telefone para poder fazer o E.T. voltar para casa, basicamente a história do filme. Junto a isso você tem de escapar dos guardas e cuidar para não cair nos infinitos buracos espalhados pelo cenário VERDE, MUITO VERDE. E esse seria o grande erro do game: Os buracos.
Segundo críticos da área, o jogo não emplacou porque de 5 em 5 segundos você invariavelmente caía em um buraco. Ok, o jogo não deu certo, mas o que fazer com os milhares de cartuchos produzidos por conta do sucesso do filme? A resposta foi nada convencional: Enterrá-los no deserto!!
Jornal local informando o sepultamento dos cartuchos
Jornal local informando o sepultamento dos cartuchos

 O contexto onde o jogo foi produzido envolvia uma Atari milionária, com o crescimento mais rápido da história do mundo dos games, com o console mais avançado à época – o Atari 2600 – e uma nova moda: Transformar os sucessos do cinema em videogames, como havia acontecido recentemente com Raiders of the Lost Ark (adaptação de Indiana Jones), que vendera milhões de cópias.
E o maior sucesso no cinema do início dos anos 80 era justamente E.T. O tamanho do sucesso foi tão assombroso que a pareceria entre a Atari, desenvolvedora do game e a Universal, estúdio detentor dos direitos do filme, foi cerca de 20 a 30 milhões de dólares. Um valor inacreditável para a época.


O desenvolvedor do game seria Howard Scott Warshaw, o maior desenvolvedor da Atari e, provavelmente do mundo, e o único a criar jogos que venderiam mais de 1 milhão de cópias na Atari. A escolha não poderia ser outra, pois recentemente Howard havia dado milhares de dólares a companhia com seu primeiro jogo, o Yar’s revenge – que também é um dos poucos a ultrapassar a barreira de 1 milhão de cópias e considerado por muitos como o melhor da plataforma. Então o que poderia dar errado com E.T?
Primeiramente a ideia de Howard foi inovadora, talvez mais do que a época conseguia absorver. Apesar dos gráficos limitados de um videogame do início dos anos 80 o jogo era em 3D, no sentido de que você podia andar para todos os lados, trocando as telas, etc. O objetivo, segundo o criador, era apostar nas interações emocionais do jogo: Elliot tentando ajudar E.T; os cientistas tentando te sequestrar para estudos, etc. Ahh, o game também lançou uma nova moda: os easter eggs, aqueles detalhes escondidos no jogo que trazem uma surpresa aos jogadores que os conseguem encontrar.

Quando ele apresentou a ideia a Steven Spielberg que dirigiu o filme na telona, o diretor perguntaria: “Não é possível fazer algo mais parecido com Pac-Man?” Não para Howard. Ele queria fazer algo digno do fime.
E esse nem foi o maior dos problemas de criação do jogo. O pior foram os prazos. A Atari pretendia lançar o jogo até o natal de 1982, o que dava cerca de 5 semanas para que Howard criasse o jogo, enquanto que o tempo normal de criação era de cerca de 5 ou 6 meses. A solução foi ele montar uma estação de trabalho em casa e trabalhar no jogo o máximo de tempo possível.

Lançado o game, inicialmente parecia um sucesso. Vendeu mais de 1,5 milhão de cartuchos, o problema foi que em pouco tempo os consumidores começaram a devolver e pedir o dinheiro de volta. Ninguém estava conseguindo entender o conceito. Fora as devoluções, cerca de 3 milhões de unidades estavam empacadas nas prateleiras, esperando por um comprador que não aparecia nunca.
A solução para esse fracasso retumbante? Bem, se você respondeu “enterrar”, então teve o mesmo pensamento que a Atari em 1983. Mas nem isso salvaria a Atarid e uma falência. O investimento em E.T. tinha sido gigantesco e nem de longe havia sido pago. O prejuízo daquele ano ficou acima da casa dos 500 milhões de dólares. E não foi só com a Atari, o mercado dos videogames entrou em colapso naquele ano. E o grande culpado: E.T. segundo muitos especialistas e revistas.
O enterro dos cartuchos em 26 de setembro de 1983 foi o funeral da Atari. Os rumores, na época, foram logo desmentidos pela companhia e por muito tempo não passou de fofoca de cidade pequena, isso, claro, até a internet surgir e criar lendas urbanas em torno de praticamente tudo, inclusive dos cartuchos enterrados no deserto. Após o tema ganhar certa notoriedade, dezenas de vídeos de escavações amadoras começaram a se popularizar pelo YouTube, todos, ou quase todos, fakes.
Porém, eles eram a ideia para que Zak Penn, amante de games, roteirista e caçador de lendas urbanas realmente escavasse o deserto de Alamogordo atrás das relíquias. E o melhor é que deu certo. O mais legal de tudo é que a aventura virou um documentário produzido pela Microsoft e você confere o trailer abaixo:

Curioso foi que de todos os games retirados do buraco, literalmente, apenas 10% eram de E.T. O resto incluía alguns dos melhores videogames já feitos, como, por exemplo, Pac-Man, Defender, Centipede e Yar’s Revenge. Estima-se que cerca de 5 milhões de cartuchos de Pac-Man foram enterrados por aí, mesmo tendo sido vendidos mais de 7 milhões. Parece que a Atari estava dando passos maiores que as pernas.

Hoje, E.T. é amaldiçoado por uma acusação leviana que não leva em conta as meras 5 semanas que Howard teve para produzir o game ou então as dificuldades que a Atari já vinha enfrentando por seu modus operandi de desenvolvimento e de negócios. Hoje em dia, Howard é considerado um pioneiro do desenvolvimento de games, um verdadeiro gênio, e E.T. uma obra prima não compreendida. No documentário acima o fundador da Atari afirma que a morte da companhia não foi um homicídio causado pelo jogo, mas sim um suicídio devido às práticas de tecnologia, implantação e marketing, por exemplo. Em uma das mancadas a Atari tentou vender 10 milhões de Atari 2600 em um mercado completamente saturado.

Se você gostou da história e gostaria de conferir o documentário completo, o mesmo já está no Netflix.

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